quarta-feira, março 14, 2007

Um dia pensei em escrever palavras pelos mais diversos sítios. Palavras que eu queria que sentisses, palavras que eu queria que lesses. Palavras óbvias a dizerem o teu significado. Mas como são óbvias eu pensei melhor. Já não as vou escrever por diversos locais. Eu não quero que tu apanhes uma overdose de palavras. As overdoses de palavras podiam quebrar ainda mais o nosso contacto. Eu não quero que as palavras se atravessem no nosso meio e se quebrem. Não quero que elas se quebrem em mil pontos e originar um monte de areia no nosso meio. Por agora ainda só temos uma camada de ar a separar-nos. Não quero um monte de areia feito de grãos de palavras a dividir-nos. Para isso, já basta a brisa de ar.

Desesperei tanto naquela noite em que me disseste: estás a ver o ar que passa entre nós? O ar leva o tempo, deixa o ar levar o tempo, deixa o tempo dar tempo ao ar. Para circular.

Inundei tanto o meu quarto em mar. Chorei tanto. Fiquei com tanta água salgada no quarto. Com tanto desespero não conseguia fazer nada, só pensava nada, pensava no vazio e sentia um vazio ainda maior no meu interior. O vazio que deixaste em mim.

Nessa noite, limitei-me a nadar de um lado para o outro: chegava a uma margem de uma parede e depois retornava para a margem paralela. Assim sucessivamente, sempre de uma margem para a outra. Sempre a nadar. Sempre a dar braçadas. Os meus braços a penetrarem suavemente na água levantando gotículas. É o meu suor. O meu esforço a andar de margem para margem. O meu esforço a matar tempo e ar. Eu ainda respirava, matava ar.

Com a exaustão das sucessivas braçadas, dei um mergulho. Mergulhei na água e ganhei uma memória daquelas de dois segundos. Aquelas dos peixes. Não conseguia, não queria pensar. Pensar dói. A racionalidade dói. Por isso, sou um peixe.

Quando saía da água, tudo voltava à normalidade. Eu voltava a recordar-me de tudo. Olhava em redor, via: tu não estavas. O meu peito sentia. As minhas retinas sentiam. As minhas retinas sentiam por cima as lágrimas a escorrer. É a dor em forma de água que saía directamente dos meus olhos e espalhava-se pelo meu quarto. O meu quarto inundado de água. De dor.

Eu espalho a dor á minha volta, porque sinto. Tenho peito. Sinto.

Os sentimentos valem muito mais que as palavras. As palavras só existem para dar nome ás coisas, para termos a certeza que elas existem. Só. Tu tens nome, existes. Eu tenho nome, existo. Os sentimentos têm nome, existem. Repito: as palavras não valem nada. Elas existem para termos a certezas acerca do que existe, para criar distinção entre as coisas. Mas contigo, jamais iria precisar de palavras para ter certezas. Para distinguir.

A minha maior certeza, és tu.

2 Comments:

Blogger Yan said...

eu não tenho certeza nenhuma

11:30 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

essa última frase doeu-me tanto. Levou-me numa viagem a um passado recente. E dói, e dói, e dói.

8:57 da tarde  

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