Percurso sem retorno.
Entretanto, parecia que algo me espiava. Parecia que as luzes dos candeeiros de iluminação me espiavam. Espiavam e riam-se nas minhas costas, pensando, olha mais um que não se consegue livrar desta. E riam-se. Era uma explosão de gargalhadas sarcásticas. Gargalhadas maléficas. Eu não ouvia as luzes, mas isto tudo era uma suposição tão óbvia. Afinal a luz que sai projectada dos candeeiros da rua, sai desfeita em múltiplos fios de luz, como os da chuva, mas estes são tão brilhantes. Estes fios penetram-me a pele e os orifícios de ouvidos e narinas, espiam-me. Espalham-se. Sabem-me ao pormenor. Sentem a minha alma. Mas mais ninguém me sabe, só os raios de luz brilhantes e tu. Tu só sabes porque eu te disse. Porém, de nada me vale.
Eu cada vez me sentia mais podre à maneira que ia digerindo o chão debaixo de mim. O calor da noite é tão sufocante. Sentia o meu corpo em água no seu interior. O suor e a podridão debaixo da minha pele a tentar brotar. Tão grande esforço eles faziam para serem expelidos. Mas a minha pele está morta. Seca. Por isso, não os conseguía expelir. Era tão notório o acumular progressivo de de suor e podridão na minha carne, no meu interior. Eu continuava sempre a andar, sempre nas ruas, labirinto, aonde quer que eu esteja. Sinais teus...nada. Nada nada. Nem um cabelo teu. Só me apercebia da escuridão de fundo e sombras de casas e ruas estampadas na escuridão. As sombras negras espantadas sobre a escuridão, sombras estas que mostram as coisas a existir na noite. Mais nada.
Após mais umas inúmeras voltas, deixei de aguentar. O meu corpo deixou de aguentar. O meu corpo já estava cheio de suor e podridão até à exaustão. Morri. Morri a insistir em ti, à tua procura.
Uma vida para mais não ver.