quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Cemitério de almas

Verdade: coberta com a tua segurança, a segurança que faz com que as tuas palavras sejam tão credíveis. Palavras que me matam, palavras cruas e directas que ditam o fim da minha bomba, a minha bomba interior que me condiciona a vida. Mas agora, a bomba explodiu e eu morri. Foram as palavras fortes, cruas. Ficou sentenciada a minha morte. Um dia tu olhaste-me nos olhos e disseste, não, não vou ignorar mais, não posso. Pelo o que eu disse o mesmo de sempre, o costume: e tu sempre ignoraste tal facto. Cansei-me. Cansei-me e abri um silêncio. O silêncio é o início de tudo e de nada. O silêncio mata as palavras mas revitaliza a dor. Por outro lado, ainda há outro tipo de silêncio: tu ouves mas não ouves, não o fazes por mal, mas não ouves.

Por isso eu calo-me. Calo-me e dou murros ao meu coração: ele grita. Ele gripa porque dói, mas consegue suportar a dor.

Eu não, eu sou frágil e fujo. Tenho medo dar dor, por isso abandono o meu corpo. Deixo a carne e saio. Saio e vou procurar um túmulo, um túmulo que me dê a vida da morte.

Procuro a minha morte no cemitério. À medida que percorro o cemitério, sou capaz de ver túmulos. Túmulos que me pertenceram no passado. Restos de mim. Túmulos estes, que armazenam as minhas mortes de antes. Túmulos que possuem almas bem enterradas, almas que nenhum significado têm. São passado, estão mortas, enterradas. Mas agora, por mais que tente, não consigo enterrar esta alma. Esta tem feridas demasiado profundas, são profundas e de uma importância extrema simultaneamente. Logo, não pode ser enterrada. Contém partes imortais de ti.

A minha alma, vai escavando no chão de betão. Eterno.
E o meu corpo? Ora esse, permanece imóvel, no mesmo local onde a alma o deixou, continua à tua espera e ali vai permanecer.


" Chorar é de Homem. "

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

As cinzas ( continuação )

E tu apanhaste as minhas cinzas. Vagueaste ruas e ruas e recolheste as minhas cinzas. Levaste as minhas cinzas e puseste-as no cinzeiro em forma de coração que está em cima da tua escrivaninha, no teu quarto.

Eu ressuscitei no teu cinzeiro em forma de coração. Ressuscitei e senti. Senti sem coração, mas senti. O meu corpo de cinzas amontoado sentiu o calor do teu cinzeiro em forma de coração, o meu corpo gélido formado de cinzas sentiu o conforto caloroso do teu cinzeiro de lata em forma de coração. O meu corpo de cinzas só sobrevive graças ao cigarro invisível que tu fumas. O cigarro invisível que tu fumas dá há luz novas cinzas que se sobrepõem no meu corpo formando novas camadas, estas que me vão alongando a vida. Enquanto fumares cigarros invisíveis e me deres o teu cinzeiro de lata em forma de coração, eu vou sobrevivendo.

O teu cigarro invisível é imortal (espero eu), e dá há luz continuamente, cinzas que vão caindo sobre o meu corpo de cinzas, formando camadas atrás de camadas revitalizando progressivamente o meu mar de cinzas no espaço oceânico do cinzeiro em forma de coração. De vez em quando, quando tu sais do teu quarto, no oceano do meu corpo vê-se embarcações de podridão a navegar por lá, mas quando regressas, usas o teu suave e cuidadoso sopro e afastas os navios podres. Nunca transbordou uma única gota de cinzas para fora. Nunca nunca, tu és o ser mais cuidadoso do mundo. Quando tornas a sair eu apodreço de novo, eu não tenho coração, mas o teu cinzeiro em forma faz-me sentir. Só quando regressas é que ganho de novo a percepção. Quando sopras.

Enquanto estiveres comigo, enquanto eu sentir o cinzeiro de lata em forma de coração, o teu coração, eu não vou precisar de um coração próprio. Tu és a ampulheta que controla os meus grãos de cinza, o meu tempo de vida.

( Este texto é uma espécie de continuação do texto anterior (Três Cigarros), não contava dar-lhe uma continuidade, mas reflexões e espécie de necessidade levaram-me a fazê-lo. Talvez um dia, quando houver motivos para tal, eu escreva o terceiro e último "capítulo". Por enquanto vai ficar assim )

domingo, fevereiro 18, 2007

Três cigarros

Eu percorro ruas e ruas. Olho-as em redor, são tão diferentes da última vez. Tão feias. Da última vez não eram assim, tinham outro brilho. Era o brilho que tu lançavas que mudava a minha visão, os teus cabelos brilhavam tanto, que cresciam na tua cabeça como uma cascata, desciam. A água dos teus cabelos espalhava-se em todo o redor. Era a coisa mais bonita do mundo. Mas desta vez não, está tudo morto. Está tudo morto porque tu não estás.

Deixaste-me um vazio tão grande no coração. O meu coração gritou tanto por ti, tanto tanto, gritou para que o ouvisses. Mas tu não ouviste, estavas longe. Mas ele continuou a gritar, gritou até á exaustão. Cansou-se. Cansou-se e saiu, deixou um vazio em forma de coração no meu coração. Só ficaram as bordas. Eu não tenho voz, o meu coração gritava, gritava com desespero, desesperou. Saiu. E eu podre continuava o meu percurso, o percurso infinito á tua procura. Tu nunca aparecias. Eu desesperava e fumava um cigarro, cada cigarro que eu fumava degradava-me e limpava-me mutuamente. O fumo que eu liberto sai com a névoa dos meus fantasmas, limpa-me. Mas cada cinza que deixo para trás são pedaços podres de mim. Pedaços que marcam a minha passagem, restos de mim. Pode ser que um dia apanhes a cinzas e as consigas juntar.

Continuo o meu percurso, melhor, as minhas pernas continuam, sim, porque eu ando perdido, as minhas pernas é que te seguem, andam com vida própria. Eu sou um morto-vivo. E fumo mais um cigarro, largo mais cinzas, solto fantasmas. E continuo a andar, continuo continuo continuo. O resultado é o mesmo. Não há sinais teus, e o meu peito desta vez é o quem grita. Eu não tenho voz, também já só me restam as bordas do vazio do meu coração em forma de coração, por isso é o meu peito que grita. Grita grita, por ti. Grita por que dói, grita porque sente a solidão. Grita porque fazes falta. Eu não sinto, perdi o coração. Mas o meu peito sente.

E os meu ouvidos que gritam? Os meus ouvidos gritam a dor do vento, gritam porque o vento os agride. O vento agride-nos porque nos quer dificultar a vida, mas as minhas pernas são mais fortes, porém de nada vale, nunca te conseguimos encontrar. Desesperadamente fumo mais um cigarro (o último) e vou-me embora, deixo as cinzas pelo caminho, pedaços de mim, pedaços que eu deixo perdidos aleatoriamente. Pedaços que marcam a minha sentença de morte.

Talvez um dia consigas reunir as minhas cinzas e dar-me vida novamente.

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

Fantasmas

E cá ando eu, perdido no interior da minha mente,
para onde quer que eu vá acabo sempre por me deparar contigo,
dou uma volta vejo-te, dou outra volta vejo-te, dou outra volta vejo-te,
sempre sempre, vezes consecutivas sem exaustão.
Dentro da minha mente eu tenho bem a percepção,
e não, tu não és um fantasma.

Não és um fantasma mas tenho medo,
tenho medo do que possa vir a acontecer,
tenho medo que satures até á exaustão e saias.
Dessa forma passarias a ser um fantasma, melhor,
se te fosses embora eu ficava com o teu fantasma na minha mente.
Disso sim, eu tenho medo.

O tempo: tenho-lhe o maior pavor do mundo.
Tenho pavor de ser engolido por ele,
tenho receio que ele te leve e não voltes,
tenho medo que o tempo não nos dê tempo.

Se eu pudesse eu roubava o tempo ao tempo,
assim, eu nunca mais necessitava de controlar ponteiros,
nunca mais tinha de escolher o tempo e o espaço,
nunca mais iria sentir o esfriar do meu sangue,
nunca mais teria fantasmas a vaguear cá dentro.

Nunca mais ia ter medo do medo.

sábado, fevereiro 03, 2007

Palavras, palavras+palavras e mais palavras

As palavras não passam de embalagens rotuladas,
elas têm um prazo de validade.
Com o decorrer do tempo, elas vão perdendo o seu valor,
até que acabam por se estragar.
As palavras têm a sua importância no momento após a sua criação,
depois, vão apodrecendo aos poucos, lentamente.

Mas uma coisa é certa, somos nós quem validamos as palavras,
somos nós quem as datamos, cada um individualmente,
cada um dentro do seu tempo, dentro do seu mundo, rodeado pelas palavras,
lhe dá o crédito que sente que deve dar.

Continuando,

Nós somos todos de mundos distintos,
não passamos de uns "alliens" que viemos parar por engano ao planeta azul.
Planeta azul? De planeta azul não tem nada, nem de azul, nem de amarelo, nem de cor de rosa.
De azul só encontro a quantidade de mar abundante, de amarelo vejo os raios solares tentar iluminar o que não dá para iluminar,
o cor de rosa é visível aquando a morte do sol todos os dias,
com toda a frustração após mais um dia de trabalho fracassado.

Adiante com as palavras,

Posso dizer que também há palavras vitalícias,
há palavras que após eu as proferir, não perdem o seu prazo,
são vitalícias.

Palavras que eu escrevo com a minha mão bem firme, com toda a lucidez,
com toda a certeza sobre o seu significado,
com a esperança de que estes traços que te digam um tanto do quanto que me dizem a mim,
para mim, eles hão-de dizer sempre tudo, são eternos,
espero que sejam sempre palavras com vida,
espero que nunca passem a ser apenas palavras a vaguear por linhas, palavras mortas no tempo,
a apodrecer-me.

No que depender de mim, terão sempre vida.



Tu és o soro das minhas palavras,
o meu soro acima de tudo.